domingo, 27 de julho de 2014

Roteiro em Salvador, inspirado em canções de Dorival Caymmi


A próxima parada do ônibus também remete a canções de Caymmi, pois é a vez de conhecer a Igreja Senhor do Bonfim, imortalizada em canções como a célebre São Salvador. Esta mítica igreja, com seu sincretismo, não conhece rivais para ilustrar a "terra do branco mulato, a terra do preto doutor": "São Salvador, Bahia de São Salvador. A terra do Nosso Senhor, do Nosso Senhor do Bonfim. Oh Bahia, Bahia, cidade de São Salvador".

Passando novamente pelo Mercado Modelo, desça, atravesse a rua, pois o roteiro prossegue em um dos cartões postais da cidade, e que constitui o meio de transporte mais autêntico do Brasil. Sim, isso mesmo, estamos falando, é claro, do Elevador Lacerda, tão conhecido dos brasileiros, até mesmo daqueles que nunca pisaram em solo soteropolitano. Porém, o que poucos sabem é que foi justamente esse elevador que trouxe o bisavô paterno e o incomum sobrenome Caymmi da Itália para o Brasil, pois a viagem do antecedente italiano do compositor se deu para trabalhar nos reparos do célebre elevador. Subindo ao centro histórico, chega-se à Praça Tomé de Sousa. De lá, caminhe em direção ao Terreiro de Jesus, passando pela Praça da Sé (à esquerda do elevador), para encontrar algumas baianas vendendo seus quitutes e ostentando seus vistosos adereços, os quais, imediatamente, trazem à lembrança os versos da música que canta o encanto da baiana: "O que é que a baiana tem? Tem bata rendada, tem! Pulseira de ouro, tem! Tem saia engomada, tem! Sandália enfeitada, tem! Tem graça como ninguém. O que é que a baiana tem?...". E se a fome já estiver desafinando a melodia, aproveite para degustar o famoso vatapá que recheia o acarajé, carro-chefe dos tabuleiros dessas baianas. A cada mordida, seu paladar recordará os versos da música que homenageia a iguaria: "Quem quiser vatapá, ô, que procure fazer. Primeiro o fubá, depois o dendê. Procure uma nega baiana, ô, que saiba mexer, que saiba mexer, que saiba mexer. Bota castanha de caju, um bocadinho mais. Pimenta malagueta, um bocadinho mais [...] Amendoim, camarão, rala um coco, na hora de machucar. Sal com gengibre e cebola, ô iaiá, na hora de temperar.". De lá, caminhe até o Largo do Pelourinho, e quem sabe você terá a sorte de assistir a um dos ensaios do Olodum, como o que presenciei no último 13 de abril, quando uma pequena formação do grupo apresentou-se nas escadarias da Fundação Casa de Jorge Amado, tocando as composições de Caymmi, para a gravação de um documentário televisivo sobre este baiano notável.

De volta ao ônibus, que rumará em direção à orla, não deixe de descer e caminhar pela praia do Rio Vermelho, onde se comemora a Festa de Iemanjá, tão aclamada na canção Dois de Fevereiro: "Dia dois de fevereiro, dia de festa no mar. Eu quero ser o primeiro, a saudar Iemanjá.". E de lá, inspirado pela canção Saudades de Itapoã, tome um táxi para passar o final de tarde na praça que homenageia o compositor, ou ainda, na praia que inspirou os versos "Coqueiro de Itapoã, coqueiro. Areia de Itapoã, areia. Morena de Itapoã, morena. Saudade de Itapoã me deixa". E, a propósito de saudade, você chegará, assim, ao fim do roteiro, e talvez já comece a ouvir os melancólicos versos de outra famosa música ecoar em sua deleitada mente: "Ai, ai que saudade eu tenho da Bahia...".

E você, que está lendo este roteiro, alguma vez idealizou uma viagem baseada numa música? Caso isso tenha acontecido, não se acanhe, entre em contato conosco e, se tiver interesse, sinta-se convidado a participar de uma aula de Roteiros Turísticos, matéria que consiste em uma informal oficina, em que nossos alunos discutem, entre outros temas, os roteiros que elaboraram a partir de músicas que já encantaram nossos ouvidos e que, numa inesquecível viagem, podem também embalar os demais sentidos.
Claudia Astorino



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